quarta-feira, 14 de maio de 2008

C´est la vie...

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{Não há razão pra te escrever
Perdi a razão ao encontrar você...}
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Eu andava sem pressa, sem rumo, distraída. Quando me dei conta veio aquele carro, desgovernado, e me acertou em cheio. E permaneço presa nas ferragens cujas chamas o tempo e a chuva estão tratando de tentar apagar. Não peço socorro. Pelo que parece, nunca me senti tão confortável. Nunca antes havia encontrado prazer em ser esmagada por desejos e acasos, como os papéis que amassamos para jogar na lixeira, mesmo sendo feita de um material muito parecido com ferro, tão forte quanto aço.
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Envolta por restos, aparentemente não sangro, não dói. Estou bem, anestesiada talvez. Mas, ao mesmo tempo, por dentro sangro, grito, sinto. Estou em pedaços, arranhada, desfigurada, nem mesmo eu me reconheço. Tranqüilamente acabada. Nunca pensei que assim fosse ser. E tento guardar cada momento, cada sensação, cada arranhão pelo meu corpo, pra que eu nunca mais me esqueça que estive ali.
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O tempo está passando. Os carros correm pela rodovia, muitos deles tão mais velozes, tão mais bonitos, novos, com pilotos tão mais distraídos do que este que acabou com meus músculos e com minha vida. Eles me oferecem ajuda, perguntam se eu não quero ir pro hospital. Eles não entendem como posso estar radiante mesmo imóvel em meio a tanto ferro, tantos restos, tantas impossibilidades. Coitados - penso - nunca sentiram o solavanco repentino e inesperado lhes fisgar nas surpresas da vida, nunca foram imobilizados por um sorriso inesperado, nunca motivaram uma labareda de emoções e foram obrigados a mudar seus planos. Nunca tiveram seus corações querendo sair pela boca, suas razões perdidas nos lençóis de uma noite inesquecível. Nunca testemunharam o momento em que aço vira papel, nem tiveram a oportunidade de torcer para que o óleo encontre a faísca. Coitados. Não conseguem entender que o melhor da vida está no explodir, neste acidente gravíssimo que acabou de acontecer.
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Eles não entendem que o eu quero mesmo é que tudo exploda. E que seja luminosa, a explosão, que ecoe pelos quarteirões e faça tremer vidros, quebrar janelas. Que perturbe sonos e faça as pessoas irem pra rua pra ver o que aconteceu. Faça as pessoas querem acidentes como o meu.
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Eu não sou o piloto. Não sou o passageiro. Eu sou o pedestre.
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E tu? Tu é os escombros.
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Toda esta vontade repentina é este acidente. E é grave.
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(Sorte a nossa...)

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